3ª Turma Especializada aplica multa em recursos protelatórios

Publicado em 12/04/2011

         Em seu discurso de posse como secretário da Reforma do Judiciário, em setembro de 2010, o atual titular da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Marivaldo Pereira, afirmou que o combate à morosidade da justiça é imprescindível para a consolidação do regime democrático: “Uma justiça morosa ou restrita a alguns poucos privilegiados jamais será digna de seu próprio nome”, afirmou.  Muitas propostas têm sido discutidas para resolver o problema, mas enquanto os projetos administrativos e legislativos  transitam pela cúpula dos três poderes, medidas baseadas nas normas já vigentes têm sido adotadas pelos juízes no dia-a-dia, para concluir os processos mais rapidamente.
         É o caso do consenso firmado pelos magistrados que atuam na 3a Turma Especializada do TRF2, na sessão de julgamento do dia 15 de março. A partir de então, o órgão colegiado passou a aplicar multa de um por cento sobre o valor da causa nos embargos de declaração apresentados contra decisões alinhadas com jurisprudência consolidada – como acontece, por exemplo, com os assuntos que tenham sido submetidos ao sistema dos chamados recursos repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
         A iniciativa visa a coibir a prática, muito comum no Judiciário brasileiro, de lançar mão de todos os meios disponíveis pelas regras processuais, apenas para atrasar a execução da sentença. A parte condenada sabe que sua tentativa não vai prosperar. A questão de que trata seu processo já foi decidida em várias causas idênticas pelos tribunais, mas, ainda assim, ela interpõe os embargos. É o que se convencionou chamar de recurso protelatório.
         Em se tratando de um órgão especializado em julgar matéria tributária que envolve, quase sempre, cobranças da Fazenda Nacional, e onde uma única causa pode implicar dívida de centenas de milhões de reais, a iniciativa da 3ª Turma Especializada promete causar impacto. A juíza federal convocada Sandra Chalu Barbosa, que integra a 3ª TE, relata que não é raro um escritório de advocacia ingressar com dezenas de embargos de declaração simultâneos, em ações que versam sobre temática mais do que pacificada: “Isso não pode acontecer. Ficamos presos numa rede de trabalho ineficaz, sem tempo para apreciar as questões de mérito que realmente concluem as ações”, queixa-se.
        O artigo 538 do Código de Processo Civil determina que os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos no processo. O parágrafo único do artigo estabelece que, “quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa”. É preciso que se diga que a deliberação de uma das duas turmas tributárias do TRF2 de aplicar a sanção não representa uma prática inédita do Judiciário, mas pode ser a primeira vez que ela é adotada como critério geral de um órgão julgador.
 
Recursos repetitivos
         A Lei n. 11.672, de 2008, modificou os procedimentos para julgamento dos recursos especiais, o nome que recebem as apelações apresentadas ao Superior Tribunal de Justiça. A partir da vigência da norma, quando há um grande número de ações que discutem a mesma questão de direito, um ou alguns casos devem ser submetidos ao STJ, ficando os demais com o andamento suspenso no tribunal de origem. Após o pronunciamento definitivo da corte em Brasília sobre o tema, os tribunais onde tramitam os processos com o mesmo questionamento devem se alinhar ao entendimento da corte superior, inclusive proferindo juízo de retratação, se for o caso: “Tal instituto foi criado com a louvável função de conferir maior celeridade e racionalidade ao serviço de prestação jurisdicional, garantindo, ainda, a uniformidade nas decisões judiciais sobre assuntos idênticos”, explica Sandra Chalu Barbosa.
        Na 3ª Turma do TRF2, na prática, vão ser levados em conta para a eventual imposição de multa não só os resultados dos julgamentos de recursos repetitivos pelo STJ, como também as decisões proferidas em ações diretas de inconstitucionalidade pelo Supremo, as súmulas dos tribunais superiores e as do próprio TRF2, entre outras orientações jurisprudenciais.
Empréstimo compulsório
         O posicionamento da 3ª TE sobre a multa por recurso protelatório já começou a produzir efeitos.  No próprio dia 15 de março, o órgão decidiu aplicar a medida por conta de embargos de declaração apresentados pelas Centrais Elétricas Brasileiras S/A – Eletrobrás.  Em 2006, uma empresa de pequeno porte  (EPP, como são classificadas pelo fisco as que obtém, em um ano, receita bruta entre R$120 mil e R$1, 2 milhão) ajuizara ação ordinária porque teria recebido a menor a restituição de empréstimo compulsório da energia elétrica.  Os créditos haviam sido constituídos entre 1977 e 1993.  Para a autora da causa, a correção deveria ser feita pelos índices integrais de inflação ocorrida nesses cerca de 16 anos, bem como deveriam ser empregados no cálculo juros compensatórios e moratórios.
        A Justiça Federal rejeitou os argumentos da empresa pública. A Eletrobrás sustentara que, no pagamento dos títulos,  teria aplicado corretamente a correção monetária, pelos índices oficiais de inflação. Com a sentença de primeiro grau desfavorável, ela apelou ao TRF2.
        No julgamento da apelação, a relatora do processo, juíza federal convocada Sandra Chalu Barbosa, lembrou, em seu voto, que a questão já fora resolvida pelo STJ em julgamento de recurso repetitivo. A 3ª TE reformou parcialmente a sentença, reconhecendo o direito à correção dos créditos apenas no período de 1987 a 1993.
         Mas, mesmo assim, a Eletrobrás interpôs agravo, reafirmando que teria usado os índices corretos de correção e alegando que o direito da autora da ação de cobrar a diferença de créditos estaria prescrito em relação a qualquer período discutido nos autos. O pedido foi negado e, por conta disso, a empresa que gera, distribui e transmite energia elétrica em todo o país apresentou embargos de declaração.
        Foi no julgamento dessa última tentativa de mudar a decisão do TRF2 que a 3a TE impôs à Eletrobrás a multa de um por cento sobre o valor da causa: “No caso vertente, nem de longe estão presentes quaisquer dos requisitos legais, muito menos qualquer omissão, contradição ou obscuridade no Acórdão unânime que exclusivamente aplicou à hipótese o entendimento pacificado no Colendo Superior Tribunal de Justiça e neste Tribunal. O fato de não concordar com este entendimento, como sustenta, é matéria que a parte deve manusear em eventual recurso especial ou extraordinário, e não em manifestamente inadequados e protelatórios embargos de declaração aos quais pretende, por via transversa, conferir efeitos infringentes ante a mais evidente ausência de requisitos legais para admissibilidade do recurso”, escreveu Sandra Chalu Barbosa.
 
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