Abel Gomes abre com palestra reunião do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas, no Rio

Publicado em 19/09/2019

O desembargador federal Abel Gomes, da Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal – 2ª Região (TRF2) proferiu na quinta-feira, 19 de setembro, a palestra de abertura do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC), formado por  procuradores de justiça. O encontro está sendo realizado até a sexta-feira, 20, na sede do Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MPRJ). Na ocasião, Abel Gomes, que é relator em segunda instância da maioria dos processos criminais da Operação Lava Jato fluminense, detalhou um painel histórico e crítico do crime organizado no Brasil e no mundo e das iniciativas de combate ao problema.

 

Mesa de abertura do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas 2019

 

A saudação inicial à plateia ficou a cargo do procurador geral de Justiça da Paraíba, Francisco Seráphico Ferraz da Nóbrega Filho. Na sequência, saudaram os presentes o procurador geral de Alagoas e presidente do GNCOC, Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, e o procurador geral do Rio de Janeiro, José Eduardo Ciotola Gussem. Também compuseram a mesa inaugural do evento os procuradores estaduais Bernardo Albano (MP do Acre), Simone Sibilio do Nascimento e Elisa Fraga do Rego Monteiro (MPRJ), Ana Emanuela Meira (MP da Bahia), Augusto Sarmento (MP do Pará) e Arthur Pinto Lemos Junior (MP de São Paulo).

Risco à paz social

Abel Gomes iniciou sua fala rebatendo argumentos em oposição às ações coordenadas do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia contra as organizações criminosas – tecnicamente conhecidas como orcrims. Segundo o palestrante, dentre outros argumentos, os opositores de medidas como as prisões temporárias e preventivas para garantia da paz pública alegam que elas não se sustentariam em um bem jurídico real, a ser protegido pelo Estado.

Abel Gomes, no entanto, destacou as evidências do risco que os grupos criminosos representam às instituições e à estabilidade política no Brasil e em outros países, apontando estudos empíricos, com base em fatos e estatísticas, que dão conta de que essas organizações buscam “se expandir quantitativa e qualitativamente pelo mundo, realizando atividades ilícitas variadas, como o tráfico de pessoas e de entorpecentes, a pirataria, o contrabando e o descaminho e até o transporte e descarte clandestino de lixo atômico”.

O desembargador e pesquisador do assunto também lembrou que a atividade das orcrims ocorre sempre vinculada à lavagem de dinheiro e à corrupção de autoridades e agentes públicos, que dariam guarida para agirem livremente. Por isso, observou, o risco à ordem pública se agrava com a influência exercida pelas quadrilhas que buscam interferir em eleições de governantes, no sistema financeiro e em licitações públicas, gerando danos à democracia, à sociedade e à economia, com violações à concorrência leal entre empresas.

 

Desembargador federal Abel Gomes

 

Intimidação de autoridades e agentes

Em seguida, Abel Gomes traçou um histórico da luta global contra o problema, ressaltando que a percepção da sua gravidade se tornou maior na década de 1920, com a atuação das máfias norte-americanas durante a vigência da chamada Lei Seca (que proibiu a fabricação e comercialização de bebidas alcoólicas nos Estados Unidos, entre 1920 e 1933). A partir daí, ele discorreu sobre o desenvolvimento das iniciativas mundiais que, disse, culminaram na “Convenção de Palermo” (aprovada em 2000, em Nova Iorque, pela Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Transnacional). Adotada pelo Brasil, a convenção deu origem a institutos como o da colaboração premiada que, para Abel Gomes, representa uma das mais importantes conquistas da batalha contra as orcrims.

Mas, apesar de reconhecer avanços, Abel Gomes manifestou sua preocupação com o que ele considera uma “tentativa sistemática de contrarreação dirigida às instituições e aos agentes estatais constitucional e legalmente investidos do dever de executar o trabalho de investigação, apuração e punição”.

Para ele, incluem-se nessa classificação propostas de criação de normas que possibilitariam a intimidação de autoridades e prejudicariam as indicações técnicas para cargos estratégicos de fiscalização, como os da Receita federal e dos órgãos aduaneiros: “Vivemos um momento preocupante no nosso país, sobretudo quando se torna notável a tolerância da sociedade a privilégios ilícitos, e mesmo a naturalização destes, como se fossem direitos. A democracia passa a ser vista como uma liberdade arbitrária que quem tem poder político ou econômico escolhe como deseja exercer”, lamentou.

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