CCJF e Emarf: Quase cinco mil anos e presença de diversas culturas marcam desenvolvimento do Direito no Líbano

Publicado em 18/05/2009

Os brasileiros, bem como toda a civilização ocidental, são herdeiros da cultura libanesa. A afirmação é do diretor-geral do Centro Cultural Justiça Federal (CCJF), desembargador federal André Fontes, e foi feita durante a abertura do “1º Simpósio Jurídico Internacional Brasil Líbano – A fórmula libanesa: realidade e perspectivas”. A asserção tem respaldo na história, é claro: os libaneses são descendentes diretos dos fenícios, povo cujos registros começam em 2.700 a.C. e que, entre várias outras contribuições artísticas, culturais, científicas e tecnológicas, deu ao mundo o primeiro alfabeto: “Os fenícios, que podem ser considerados os primeiros libaneses, foram o único povo a resistir às investidas bélicas de Alexandre o Grande (no século 4º a.C.). E os episódios em que este povo mostrou sua força e dedicação se multiplicam pelos séculos. Somos todos tributários dos exemplos de luta pelos ideais legados pelo Líbano”, afirmou o desembargador.

O evento, realizado graças a uma parceria entre a Escola da Magistratura Regional Federal da 2ª Região (Emarf), o CCJF e a Federação das Entidades Libano-Brasileiras do Rio de Janeiro (FELB-RJ), tomou todo o dia 18 de maio e contou com palestrantes dos dois países. Além de André Fontes, a mesa de abertura foi composta pela diretora-geral da Emarf, desembargadora federal Maria Helena Cisne, pelo cônsul geral do Líbano no Brasil, Ali Daher, pelo presidente da Federação das Entidades Líbano-Brasileiras do estado do Rio de Janeiro (Felb-RJ), Nelson Mofarrej, e pelo advogado e vice-presidente da Felb-RJ, Michel Chaachaa.

A partir da esquerda: Theophilo Miguel, Ali Daher, MAria Helena Cisne, André Fontes, Nelson Mofarrej e Michel Chaachaa

A partir da esquerda: Theophilo Miguel, Ali Daher, MAria Helena Cisne, André Fontes, Nelson Mofarrej e Michel Chaachaa

Ainda na abertura, fazendo um breve uso da palavra, o cônsul Ali Daher defendeu a cooperação institucional e acadêmica – ainda muito incipiente – entre seu país e o Brasil, que, para ele, são a melhor forma de se criar laços permanentes que resultem em cooperação em todas as áreas: “Espero que este simpósio preencha uma lacuna, e que a iniciativa repercuta em outras regiões e países, abrindo uma janela de esperança para o futuro”.

O sistema jurídico libanês

A antiga Fenícia também foi o ponto de partida da palestra inaugural do evento, apresentada pela juíza do Conselho Consultivo do Estado da República Libanesa, Amal El Rassy. Mestra em Direito Francês pela Universidade Saint Joseph, fundada em 1875 pelos jesuítas, ela abriu seu tema explicando a evolução dos sistemas jurídicos de seu país. Ela explicou que os fenícios viviam sob um sistema jurídico consuetudinário, praticamente desprovido de regras específicas. Mais tarde, em 63 a.C., o país tornou-se província romana e incorporou o sistema jurídico latino.

Em 636 o domínio passa aos árabes e entra em vigência o direito muçulmano, que, tolerante, adota um regime multiconfessional, garantindo o direito das diversas comunidades locais de aplicar suas próprias normas no direito privado. A partir do fim da 1ª Guerra Mundial, na década de 1920, o Líbano fica sob mandato francês, o que resulta na estruturação de um Direito Civil baseado no Código Napoleônico. 22 de novembro de 1943 é a data da proclamação da independência do Líbano, mas o sistema jurídico, explica a palestrante, continua com uma forte inspiração francesa.

Exposta essa cronologia, Amal El Rassy falou sobre o Conselho Constitucional, criado em 1989. O órgão máximo do judiciário libanês tem por objetivo o controle concreto das leis quanto à sua constitucionalidade e suas decisões têm efeito erga omnes. A tarefa é competência exclusiva da corte, diferente do que ocorre no sistema americano, em que qualquer tribunal, de qualquer esfera e instância, pode se pronunciar sobre a constitucionalidade das leis. E, curiosamente, diferente até do sistema francês, que admite a análise constitucional antes mesmo da promulgação da lei. No Líbano, o controle acontece a posteriori, considerando que a lei só existe após ser promulgada. Para a palestrante, o sistema da França tem a vantagem de evitar problemas decorrentes da aplicação de leis inconstitucionais, impedindo que elas cheguem a produzir efeitos, às vezes difíceis de corrigir.

Amal El Rassy concluiu sua fala explicando a estrutura e funcionamento do Conselho Consultivo do Estado, que tem a atribuição de julgar os atos dos entes públicos e, em vários casos, auxiliar na elaboração desses atos, como portarias ministeriais, por exemplo. Formado por um presidente, um comissário do governo, os presidentes das várias câmaras que compõem o órgão e um corpo de conselheiros de Estado, os temas apreciados pelo órgão envolvem qualquer tipo de matéria administrativa, cassação de atos do Executivo, questões disciplinares, bem como as que envolvam tributos – o que dá logo a entender que a atuação da corte tem quase sempre caráter de urgência: “O controle da legalidade dos atos administrativos das autoridades, das pessoas de Direito Público, pode ser prévio ou a posteriori, diverso do que acontece no Conselho Constitucional, e sempre exige uma atuação rápida de seus membros”, ressaltou a juíza.

Programação variada

Dando continuidade ao evento, ainda na parte da manhã, foi a vez do doutor em Direito Internacional e presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB de Minas Gerais, o advogado Leonardo Nemer Caldeira Brant, falar sobre “A Dinâmica das Relações Brasil-Líbano à Luz do Direito Internacional Atual”. À tarde, a programação foi aberta com a conferência “As Relações entre a Administração Pública e o Particular diante do Direito Libanês”, proferida pelo juiz da Corte Administrativa de Beirute, Hasan Chami. Em seguida, a palavra ficou com o professor de Relações Internacionais da Universidade Saint Joseph, Roger Edward Achkar (A República Libanesa e as Relações com a Comunidade Internacional). Fechando a agenda, o cônsul Ali Daher discorreu sobre o tema “Líbano: Limites da Sociedade, Limites do Direito”.

O “1º Simpósio Jurídico Internacional Brasil Líbano – A fórmula libanesa: realidade e perspectivas”, que teve palestras em francês, árabe e português foi aberto ao público, e contou com tradução simultânea e transmissão por videoconferência para a Seção Judiciária do Espírito Santo. O evento, que integra o cronograma de 2009 do Curso de Aperfeiçoamento e Especialização – CAE para magistrados federais da 2ª Região, foi apoiado pelo TRF2, pelas Seções Judiciárias do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), pela Associação dos Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo (Ajuferjes), pela Confederação Nacional das Entidades Libano-Brasileiras (Confelibra), pela Câmara de Comércio Brasil-Líbano do Rio de Janeiro e pelo Consulado Geral do Líbano no Rio de Janeiro.

Compartilhar: