Direitos a procura de um autor: Juiz federal fala sobre projeto que cria nova lei dos processos coletivos e sobre acesso universal à Justiça

Publicado em 21/09/2009

        O processo judicial é historicamente individualista. As regras que governam as ações nos tribunais pelo mundo afora tratam muito mais das disputas entre fulano e beltrano do que das questões que interessam à coletividade. Para o juiz federal, pós-doutor em Direito pela Universidade de Regensburg, Alemanha, e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Estácio de Sá, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, isso tem que mudar, considerando que os vínculos e as interações da sociedade (que o Direito existe para regular) já mudaram, e muito, desde que os primeiros institutos legais foram criados pelos romanos na era pré-cristã.
        Em entrevista ao Habeas Data, Aluisio Mendes fala sobre o trabalho da comissão especial, da qual ele faz parte, que foi criada com o objetivo de estabelecer uma nova lei das ações coletivas, mais afinada com a realidade atual e, principalmente, que unifique em um só texto as normas que cuidam de direitos de parcelas ou de toda a comunidade brasileira, como o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do Idoso. Ou, em linguagem mais técnica, a comissão instituída pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, em 2008, visa ao “aprimoramento e à modernização das leis que tratam de direitos coletivos, difusos e meta-individuais homogêneos”.
        As atividades seguem em ritmo acelerado. O trabalho já tomou corpo como projeto de lei (PL 5.139/09) e passa pelo crivo da Câmara dos Deputados. No dia 18 de junho, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania realizou uma audiência para discutir a proposta. Entre os expositores, esteve o juiz federal Aluisio Gonçalves de Castro Mendes. Ele acredita que, nesse passo, a lei estará aprovada ainda este ano.
A intenção é grandiosa: além de revolucionar os preceitos do processo brasileiro, o plano traçado aqui deverá servir de modelo para outros países ibero-americanos elaborarem seus códigos de processos coletivos. Afinal, a ideia de construir uma legislação processual unificada no país surgiu em um encontro de juristas brasileiros, portugueses, espanhois e de outras nações da América Latina, realizado em Roma, há sete anos.
        Para garantir uma visão bastante abrangente dos temas discutidos, a comissão formalizada por portaria do Ministério da Justiça é composta por estudiosos da matéria, e também por representantes de diversas instituições, como o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Casa Civil da Presidência, a Advocacia Geral da União, a Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério da Fazenda e, claro, o próprio Ministério da Justiça.
 A presidência do grupo, composto de 24 membros, está a cargo do atual Secretário da Reforma do Judiciário, Rogério Favreto. O professor do curso de pós-graduação em Direito da PUC de São Paulo, Luiz Manoel Gomes Junior, é o relator. Entre outros nomes de peso do cenário jurídico brasileiro, o grupo conta ainda com a participação da conselheira da OAB e diretora da Escola Superior de Advocacia, Ada Pellegrini Grinover, do ministro do STJ Athos Gusmão Carneiro e do promotor de Justiça e doutor pela USP, Ricardo de Barros Leonel.

        Habeas Data – Como surgiu a ideia de criar uma nova lei das ações coletivas no Brasil?

        Aluisio Mendes – O processo civil, no mundo inteiro, sempre foi muito individualista…é  aquele pensamento da Roma antiga, de Caio versus Tício (Caio e Tício são personagens modelares dos livros de Direito e representam, alternadamente, o réu ou a vítima de casos hipotéticos, usados para ilustrar o debate jurídico). Só que vivemos numa sociedade na qual as relações de massa precedem as relações privadas. Quem adquire uma linha telefônica, por exemplo, adquire um plano que não é só seu. É de milhares de pessoas. É por isso que o contrato recebe o título ‘de adesão’, já que o adquirente está, ao assiná-lo, filiando-se, ou aderindo, a um plano coletivo”. As relações de trabalho também servem como exemplo: as questões entre um funcionário e seu empregador são as mesmas que afetam todos os trabalhadores da empresa. Sem falar nos temas que comprometem a sociedade inteira, como os problemas ambientais.
        Foi a percepção da necessidade de adequar o processo aos tempos atuais que inspirou a proposta de estruturar uma nova legislação, proposta que começou a ser discutida em 2002, durante um encontro do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual, realizado em Roma. Houve um outro encontro em Caracas, em 2004, no qual foi aprovado o projeto que começara a ser trabalhado dois anos antes e, mais tarde, o Ministério da Justiça encampou a ideia, criando a comissão, em 2008…

A íntegra da matéria acima pode ser lida na versão eletrônica da revista Habeas Data 72, que você pode acessar clicando aqui.

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