Patentes de remédios têm limite de 20 anos contados do pedido ao INPI. Tese do TRF2 vale para processos do RJ e do ES

Publicado em 27/06/2019

O prazo de validade das patentes de medicamentos e de produtos agroquímicos no Brasil é limitado a vinte anos contados da data do depósito do pedido no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Sendo assim, não vale o argumento dos laboratórios, que defendem a vigência da exclusividade de produção e comercialização desses produtos por, pelo menos, dez anos, calculados da data da concessão da patente.

Essa foi a tese firmada pela 1ª Seção Especializada do TRF2, que julgou na quinta-feira, 27 de julho, incidente de resolução de demanda repetitiva (IRDR) apresentada pelo Trinity College, universidade sediada em Dublin, Irlanda. A instituição pretendia convencer os julgadores a mudar o entendimento que já vinha sendo adotado pela Corte e que, no entanto, agora foi confirmado.

Na prática, por conta da demora do INPI em analisar os pedidos de patente, a mudança de entendimento beneficiaria grandes indústrias farmacêuticas, possibilitando a extensão do prazo de proteção para além dos vinte anos previstos na Lei de Propriedade Industrial (LPI). Com a decisão, o TRF2 define orientação que deverá ser seguida em todos os processos que tratem do mesmo tema na Justiça Federal do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. Este foi o primeiro IRDR julgado pela 1ª Seção Especializada. O instrumento, que serve para a unificação de entendimento sobre demandas idênticas em segundo grau de jursidição, foi instituído pelo Código de Processo Civil de 2015.

O caso começou com uma ação ajuizada pelo INPI pedindo a declaração de nulidade da patente PI9700768-4, que se refere a uma vacina viva para combater infecção por estreptococos (um gênero de bactérias) em cavalos. O registro havia sido concedido ao Trinity College pelo própria autarquia, que decidiu rever administrativamente a validade de centenas de registros. A 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro concedeu antecipação de tutela (um tipo de liminar) ao INPI. Contra essa medida, a instituição do Reino Unido recorreu ao Tribunal, que manteve a decisão de primeiro grau. Por conta disso, o Trinity College suscitou o IRDR.

Entenda a controvérsia

O primeiro código brasileiro da propriedade industrial foi a Lei nº 5.772, de 21 de dezembro de 1971, que vetava o patenteamento de remédios e produtos agroquímicos. Em 1994, o Brasil aderiu ao acordo TRIPs (em português, Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio), firmado em um encontro realizado naquele ano no Uruguai, quando foi criada a Organização Mundial do Comércio (OMC).

Nas negociações, os Estados signatários se comprometeram a manter regras de proteção para esses produtos, o que, no Brasil, realizou-se com o Decreto nº 1355, de 1994. Dois anos depois foi sancionada a nova Lei de Propriedade Industrial (LPI – Lei 9.279/1996), que, retroativamente, garantiu a patenteabilidade de medicamentos depositados no INPI entre o início da vigência do Decreto 1355/1994 e o da atual LPI, ou seja, entre 1º de janeiro de 1995 e 14 de maio de 1997.

Nas ações judiciais, as empresas farmacêuticas costumam basear os argumentos no parágrafo único do artigo 40 da nova lei, que prevê o prazo mínimo de dez anos de vigência da patente, a contar da data de concessão. Mas, no entendimento unânime dos julgadores da 1ª Seção Especializada, essa contagem não se aplica às patentes de medicamentos, já que o artigo 229 da LPI ordena que o cálculo do prazo, para esses produtos, seja feito a partir da “data efetiva do depósito do pedido no Brasil ou da prioridade, se houver, assegurando-se a proteção a partir da data da concessão da patente, pelo prazo remanescente a contar do dia do depósito no Brasil, limitado ao prazo previsto no caput [cabeça] do artigo 40”. O caput desse artigo determina a vigência da patente de invenção pelo prazo de vinte anos.

Interesse público

Em seu voto, o relator do IRDR, desembargador federal Ivan Athié, ressaltou a necessidade de fixação de uma tese jurídica sobre o problema e destacou que a interpretação da norma deve “resguardar prioritariamente o interesse público, em detrimento do particular”. O magistrado rebateu o argumento de que o Judiciário Federal estaria quebrando a isonomia em relação ao tratamento dado à questão pelos demais países da OMC, já que “escritórios de patentes de outros Estados membros, correspondentes ao INPI, também adotam critérios que estabelecem a precedência do interesse coletivo”.

Ainda, Ivan Athié, citando o parecer do Ministério Público Federal, ponderou que a dificuldade do INPI em analisar os pedidos de patente com rapidez não serve de justificativa para beneficiar a indústria farmacêutica: “O ônus da mora não pode ser transferido para a sociedade”, alertou.

Concluindo, o relator lembrou que os laboratórios contam com a proteção de seus produtos desde a data do depósito, independentemente de haver patente concedida, já que o artigo 44 da LPI assegura o direito de indenização pela exploração indevida do produto, “inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e a da concessão da patente”.

Processo 0014410-75.2017.4.02.0000

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