TRF2 julga apelação criminal de onze réus no processo criminal da máfia dos caça-níqueis

Publicado em 10/12/2010

         A 2ª Turma Especializada do TRF-2ª Região julgou, no dia 9 de dezembro, as apelações de 11 réus condenados em primeira instância por integrar a chamada máfia dos caça-níqueis, desbaratada em dezembro de 2006 durante operação da Polícia Federal. Na decisão da Turma, foram mantidas as sentenças de dez dos acusados. Eles se dividiam em três grupos, que lutavam entre si pelo controle dos pontos de exploração ilegal do jogo na zona oeste do Rio de Janeiro, e eram liderados por Fernando Miranda de Iggnácio, genro do falecido banqueiro do jogo-do-bicho Castor de Andrade, Rogério de Andrade, sobrinho do bicheiro, e Paulo César Ferreira do Nascimento, conhecido como Paulo Padilha. Ainda no julgamento, a 2ª Turma Especializada determinou a expedição de ordens de prisão contra Fernando Miranda de Iggnácio e Rogério de Andrade, que estão sendo cumpridas na sexta-feira, 10.
         As penas, referentes aos crimes de formação de quadrilha, contrabando e corrupção ativa e passiva variam de sete a 18 anos de reclusão. As mais altas foram impostas aos chefes dos três bandos. O único absolvido foi o policial civil Jorge Luiz Fernandes, sob a fundamentação de não existirem provas suficientes de sua participação na organização criminosa.
         Em um voto de mais de 300 páginas, a relatora do proceso no TRF2, desembargadora federal Liliane Roriz, rebateu as alegações da defesa dos acusados, baseados na ilegalidade das escutas telefônicas, que teriam sido o elemento principal de prova em que se apoiaram as condenações. Os advogados sustentaram que as gravações teriam sido editadas pelos policiais e que os nomes dos supostos donos das vozes teriam sido acrescentadas nos autos pelos investigadores. Também alegaram, entre outros argumentos, que a importação de noteiros, ou seja, leitores óticos para a identificação automático de cédulas usados nas máquinas caça-níqueis, não poderia ser considerada contrabando, já que o equipamento também é utilizado em máquinas como as que comercializam refrigerantes em estações de metrô. Na tese da defesa dos réus, isso significaria que a importação dos dispositivos seria permitida, descaracterizando o crime de contrabando.
         Ainda, o advogado de Rogério de Andrade defendeu a nulidade da sentença, já que seu cliente, que estava preso durante o curso da ação penal na primeira instância, não teve garantido o direito de comparecer a todas as audiências realizadas pela Justiça. No entendimento de Liliane Roriz, o argumento não procede, já que não foi demonstrado o efetivo prejuízo que o réu teria sofrido por não ter presenciado as audiência e que foi assegurada a ampla defesa ao acusado.
          A desembargadora ainda destacou a licitude das provas produzidas por escutas telefônicas, que foram autorizadas pelo Judiciário apenas depois que a Polícia Federal apresentou em juízo vários indícios da materialidade e autoria dos crimes. Também, ressaltou Liliane Roriz, o teor das gravações foi disponibilizado aos advogados dos réus desde o início do processo: “A defesa poderia tê-lo contraditado oportunamente”, afirmou.
         Com relação ao crime de contrabando, Liliane Roriz explicou que não importa que os noteiros sejam utilizados legalmente em máquinas como as de refrigerantes, já que o artigo 334 do Código Penal estabelece que comete esse crime quem, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente.
         A relatora recordou, durante o julgamento, que foi preciso determinar a transferência de Fernando Iggnácio de Miranda e Rogério Andrade para o regime disciplinar diferenciado (RDD), em razão de ter ficado comprovado que eles estariam promovendo, mesmo no cárcere, festas, inclusive com a participação de garotas de programa, além de continuarem comandando ações das quadrilhas, fazendo uso, para isso, de celulares e laptops. Rogério de Andrade, custodiado na Polinter de São Gonçalo (região metropolitana do Rio), chegou a se referir à prisão como “spa”, em uma ligação interceptada.
         Concluindo seu extenso voto, a desembargadora federal Liliane Roriz chamou atenção para a gravidade das denúncias, todas comprovadas no processo, principalmente em relação aos acusados que exerciam cargos públicos: “Os maiores atingidos foram a população da zona oeste do Rio de Janeiro, que se viu em meio a uma violenta disputa, na qual mais de 50 homicídios foram cometidos, bem como muitos comerciantes donos de bares e pequenos estabelecimentos, pessoas de bem que foram coagidas a instalar máquinas caça-níqueis em suas lojas”, disse.
          Entre os onze réus do processo criminal estão o coronel da Polícia Militar Celso Nogueira, que respondia, na época dos crimes, pelo 14º Batalhão de Bangu. Segundo a denúncia, ele recebia propina para permitir a atuação das quadrilhas na região. Também são réus, além do policial civil Jorge Luiz Fernandes, o único absolvido, os policiais Hélio Machado da Conceição e Fábio Menezes de Leão. Eles ficaram conhecidos como o grupo dos “inhos”, por terem seus nomes referidos sempre no diminutivo nas ligações gravadas.
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