TRF2 realiza evento sobre quilombolas com debates e atividades artísticas e culturais em novembro

Publicado em 20/08/2018

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região realizará, no dia 23 de novembro, o evento “Quilombolas: aspectos políticos, jurídicos e políticas públicas inclusivas consequentes à edição do Decreto nº 4887-2003 e do julgamento da ADI nº 3239”. O encontro será realizado na sede da Corte, no centro do Rio de Janeiro, e reunirá autoridades, juristas, pesquisadores das áreas de história e ciências sociais, estudantes e lideranças do movimento negro. O objetivo é debater questões envolvendo as terras de comunidades formadas por descendentes de escravizados. O evento será aberto ao público.

Segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), desde a edição do decreto, há quinze anos, 206 áreas quilombolas com cerca de 13 mil famílias foram regularizadas, mas aproximadamente 3,2 mil comunidades ainda continuam sem título. Uma das participantes do encontro será a sra. Marilda de Souza, griô (líder) do Quilombo de Santa Rita do Bracuí, no litoral sul-fluminense do Rio. Ela representa uma das milhares de comunidades que lutam pela titulação das terras.

 

Marilda de Souza, griô do Quilombo de Santa Rita do Bracuí

 

A comunidade quilombola luta há mais de cem anos pelo território coletivo ocupado por seus antepassados, desde antes de o receberem oficialmente, em 1878, em doação no testamento de José de Souza Breves, que ali desenvolvia atividades cafeeiras na primeira metade do século 19. O proprietário da antiga fazenda do Bracuí deixou os ex-escravizados com o usofruto das terras após o encerramento das atividades. Em seu testamento, eles foram depois alforriados e transformados em herdeiros do território ocupado.

Os griôs do Quilombo do Bracuí são guardiões da memória dos horrores cometidos contra os recém-chegados e da sua recuperação para serem enviados serra acima, para as áreas cafeicultoras do Vale do Paraíba. A tradição oral guardou até mesmo o naufrágio em águas próximas à fazenda, do Brigue Negreiro Camargo, perseguido pela Marinha brasileira após a segunda lei de extinção do tráfico atlântico, em 1850. O naufrágio deixou documentos históricos na auditoria da Marinha e no Ministério da Justiça brasileiros. No entanto, ainda hoje, o território comunitário continua ameaçado apesar da certificação da Fundação Palmares como comunidade quilombola.

A Câmara Municipal de Angra dos Reis realizou no mês de junho uma audiência pública para tratar do tema “Comissão da Verdade da Escravidão do Quilombo do Bracuí”. O caso vem sendo acompanhado pelo Instituto de Advocacia Racial e Ambiental  (IARA). O assunto também tem sido estudado pelo Laboratório de História Oral e Imagem (LABHOI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), instituição que também participará do encontro em novembro.

Confira alguns vídeos.

Palestras, cultura e arte

Além de palestras e debates, a programação do evento “Quilombolas: aspectos políticos, jurídicos e políticas públicas inclusivas” incluirá atividades artísticas e culturais. No dia 19 de novembro, por exemplo, será inaugurada uma exposição de fotografias com o tema “Quilombolas”, que ficará exposta no Salão Nobre do Tribunal. Já no dia 24 de novembro, ocorrerá um ato ecumênico, com o objetivo de reunir sacerdotes de cultos de matriz africana e de outras religiões, para uma cerimônia de consagração do local onde se localiza a Corte: “Será uma expressão de respeito, uma dignificação das mulheres, homens e crianças desterradas para o Brasil e que perderam a vida, muitas vezes, ainda na travessia marítima, devido aos maus tratos, à fome, à sede e a doenças”, declarou o presidente do TRF2, desembargador federal André Fontes.

O presidente do TRF2 também destacou a importância de colocar em pauta a questão quilombola, em razão da atuação da Justiça Federal, onde tramitam as ações sobre a titularidade dessas terras: “É fundamental que se assuma o dever de reconhecer, em primeiro lugar, que há uma memória a ser resgatada, valorizada e preservada, considerando que no Judiciário desembocam os conflitos concernentes à identificação e reparação de direitos”, afirmou.

O desembargador ponderou que, sem a titulação das terras, as comunidades tradicionais sofrem com a falta de investimentos públicos e, ainda, acabam sendo alvos de conflitos sobre a ocupação das terras. Em maio de 2016, ele mesmo conduziu uma audiência pública, no curso da instrução de três processos de desapropriação de sua relatoria, cujos objetos tratam da regularização da propriedade dos territórios em que se encontram instaladas comunidades remanescentes do Quilombo de Santana (Município de Quatis – RJ). Em fevereiro de 2017, os pedidos foram julgados prejudicados pelo Órgão Especial do TRF2. A medida foi tomada em função do julgamento, pelo STF, da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239.

A decisão do Supremo reconheceu a constitucionalidade do Decreto nº 4887, de 2003, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos, conforme previsto no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

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