Recital da Série ViolÔes da AV-Rio de 23-11-2019

Nicolas de Souza Barros (13-04-2020)

 

Centro Cultural Justiça Federal. Centro, Rio de Janeiro.
Av. Rio Branco 241, Sala das SessÔes. 17:00.

 

Fernando AraĂșjo e Celso Faria: violĂ”es

Monica Pedrosa: soprano

Programa: Francisco Mignone: duos de violĂŁo “Manuscritos de Buenos Aires” e a integra das cançÔes para voz e violĂŁo.

 

 

No sĂĄbado passado – 23 de novembro de 2019 – tivemos a oportunidade de ouvir um dos programas mais originais da histĂłria da SĂ©rie ViolĂ”es da AV-Rio. Os mineiros Fernando AraĂșjo, Monica Pedrosa e Celso Faria fizeram a primeira audição no Rio de Janeiro dos “Manuscritos de Buenos Aires” de Francisco Mignone, para duo de violĂ”es, compostos pelas seguintes obras: a) “Quatro Peças Brasileiras: 1. Maroca; 2. Maxixando; 3. Nazareth; 4. Toada:, b) “ 1ÂȘ Valsa Brasileira”; c) “2ÂȘ Valsa Brasileira”; d) “Canção”; e) “Lundu”. TambĂ©m apresentaram o cancioneiro integral para voz e violĂŁo do compositor: “Choro”; “Dialogando”; “O impossĂ­vel carinho”; “Pardonnez moi”; “Vous reverrai-je um jour?”; “Las mujeres son las moscas” e “Nana”.

Os duos para violĂŁo foram descobertos por Fausto Borem, professor da UFMG, e objeto de tese de doutorado de Fernando AraĂșjo (UFMG; 2017). Compostos em 1970, apĂłs Mignone ter participado do 2° SeminĂĄrio Internacional de ViolĂŁo de Porto Alegre, sĂŁo versĂ”es de obras para piano da sua juventude e foram dedicados ao duo argentino Graciela Pomponio (1926-2007) e Jorge Martinez Zarate (1923-1993), ambos eminentes instrumentistas e pedagogos.

A “1ÂȘ Valsa Brasileira” Ă© uma adaptação da “2ÂȘ Valsa de esquina para piano”, enquanto que a “2ÂȘ Valsa Brasileira” Ă© adaptada da “5ÂȘ Valsa de esquina”. A “Canção” Ă© um arranjo livre de “Mandinga Doce”, uma canção sertaneja de Mignone publicada em 1930 sob o pseudĂŽnimo de Chico BororĂł; tambĂ©m existe uma versĂŁo para violĂŁo solo: “Brazilian Song”. O “Lundu” Ă© uma adaptação de uma obra homĂŽnima para piano. As “Quatro Peças Brasileiras” foram adaptadas de uma suĂ­te para piano composta quando Mignone estudou em MilĂŁo (dĂ©cada de 1920), sendo publicada em 1930 pela Editora Ricordi. Estas obras foram aproveitadas posteriormente pelo compositor em obras para para quarteto de cordas, quarteto de fagotes, e no caso dos movimentos “Nazareth” e “Toada”, para orquestra de cordas.

Sobre a produção vocal do compositor, Fernando AraĂșjo escreve “Por vezes, as cançÔes revelam a inquietação de Mignone, que por vezes trata a voz de maneira pouco convencional”. “O impossĂ­vel carinho”, verdadeiro “tour de force” para canto, Ă© uma adaptação da “Valsa de Esquina 7” para piano. “Choro” e “Dialogando” sĂŁo para vocalise (sem letras); “Pardonnez moi” e “Vous reverrai-je um jour?”, belas criaçÔes, tĂȘm letras em francĂȘs, e “Las mujeres son las moscas” e “Nana” em espanhol.

Esteve presente ao concerto Sergio Abreu, um dos principais luthiers nacionais e tambĂ©m um dos maiores violonistas brasileiros das dĂ©cadas de 1960-70. Ele mencionou que apresentava com a notĂĄvel soprano Maria Lucia Godoy um grupo de obras de Mignone em diversos recitais. Estes incluĂ­am “O impossĂ­vel carinho” (com poema de Manuel Bandeira e dedicado justamente ao Duo Maria Lucia Godoy e Sergio Abreu), o “Estudo 2” para violĂŁo solo, assim como dois arranjos dele (Sergio) das cançÔes “No meio do caminho” e “Canção de Ninar”.

Sergio elogiou a voz de Monica Pedrosa, destacando a sua musicalidade, afinação impecĂĄvel e sonoridade aveludada em registros agudos. Para mim, os pontos altos do recital foram justamente “O impossĂ­vel carinho” e as cançÔes em francĂȘs. NĂŁo somente pela execução dos interpretes como tambĂ©m pelas texturas sonoras idealizadas pelo compositor. Estas obras precisam ser mais ouvidas em salas de concerto!

Os duos para violĂŁo receberam dos dois instrumentistas execuçÔes convincentes que indicaram a importĂąncia dessas obras, quase desconhecidas no cenĂĄrio brasileiro. Este foi um dos concertos mais memorĂĄveis da sĂ©rie desde a sua gĂȘnese em 2001, tanto pela qualidade dos intĂ©rpretes quanto a força e originalidade do repertĂłrio apresentado.