TRF2: Presidente palestra na África do Sul sobre subtração internacional de crianças em contexto de violência doméstica

Publicado em 20/06/2024

O presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), desembargador federal Guilherme Calmon, palestrou nesta quinta-feira (20/6), em Joanesburgo, na África do Sul, no Fórum sobre Violência Doméstica e a Convenção da Haia de 1980, que trata da subtração internacional de crianças. O encontro tem foco no debate sobre as hipóteses previstas no artigo da convenção que cuida das exceções ao retorno da criança para seu país de residência habitual.

Guilherme Calmon é o coordenador da Rede Brasileira de Juízes de Enlace, assim chamados por exercerem a ligação entre os Judiciários das nações envolvidas em um conflito parental internacional. Em sua fala, ele defendeu que a conclusão de qualquer discussão sobre o tema deve se nortear pelo melhor interesse e pelo bem-estar da criança, em defesa da qual a Convenção da Haia de 1980 foi concebida.

 

Desembargador federal Guilherme Calmon palestra, na África do Sul, no Fórum sobre Violência Doméstica e a Convenção da Haia de 1980

 

O palestrante, contou que, desde a pandemia de Covid-19, os três juízos federais competentes para processar e julgar casos de subtração internacional de crianças no Rio de Janeiro resolveram 16 ações envolvendo essa situação. Em 13 deles, a violência doméstica foi alegada como motivo para as mães trazerem suas crianças para o Brasil.

A partir das soluções aplicadas pelos julgadores em três casos selecionados (nos três as crianças foram devolvidas aos seus países de origem), o coordenador da rede nacional de juízes de enlace fez algumas ponderações. A primeira foi que a simples alegação de violência doméstica, sem evidências que a apoiem, não deve ser impeditivo para o retorno da criança ao local onde estão suas raízes culturais e emocionais.

Uma segunda reflexão foi o reconhecimento de que casos de violência doméstica podem ser adequadamente resolvidos pelas autoridades, e por meio dos mecanismos próprios do Estado requerente da devolução. A última observação foi de que a exceção a essa medida é cabível quando, diante de evidências da violência, não houver instituições e mecanismos estatais capazes de garantir a segurança no país de residência habitual do criança.

Na sequência, Guilherme Calmon discorreu sobre as proteções que a legislação brasileira garante às mulheres no país, começando pela obrigação do Estado de assegurar a assistência à família, criando meios para coibir a violência no lar: “Trata-se de um comando que, em concordância com o princípio fundamental da dignidade da pessoas humana, busca prevenir e reprimir atos de violência doméstica em termo de proteção da integridade física e psicológica dos membros da família”, pontuou.

Ele citou também a Lei Maria da Penha, que lista as hipóteses de violência doméstica, incluindo a agressão física, psicológica, sexual, patrimonial e moral; a tese vinculante muito recentemente firmada pelo STF, proibindo, em investigações e julgamentos, qualquer tipo de desqualificação da mulher vítima de violéncia sexual ou doméstica; a política judiciária nacional de combate à violência doméstica e o protocolo para julgamentos sob a perspectiva de gênero, estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça; e os debates que vêm sendo realizados no Legislativo, com a participação de entes públicos e representações da sociedade civil.

Por fim, o desembargador falou sobre as conclusões do Encontro Regional dos Juízes da Rede Internacional da Haia – América Latina e Caribe, realizado no Rio de Janeiro, em maio deste ano. Promovido pelo TRF2 em parceria com a Rede Brasileira de Juízes de Enlace, o evento resultou na elaboração da “Carta do Rio”.

O documento inclui, dentre os desafios identificados, o de “prover atenção à proteção da criança, em harmonia com os direitos da família, no quadro dos direitos humanos, aplicando uma perspectiva de gênero e de proteção às crianças”.

E, dentre as propostas, “a continuidade e aprofundamento das discussões, entre os juízes da Rede Internacional da Conferência de Haia sobre Direito Internacional Privado, sobre as questões de violência de qualquer tipo que surgem como exceções em casos de subtração, a fim de analisá-las de forma a garantir os direitos de todas as partes e, principalmente, os da criança”.

 

Fórum sobre Violência Doméstica e a Convenção da Haia de 1980, que trata da subtração internacional de crianças
Compartilhar: