Impacto econômico de decisões judiciais é destaque no seminário Direito e Economia realizado pelo TRF2 e pela FGV

Publicado em 18/03/2019

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha proferiu no dia 15 de março a palestra magna do seminário “Direito e Economia: Finanças Públicas e Concorrência no Sistema Financeiro Nacional”. O evento, realizado em parceria pelo Tribunal Regional Federal 2ª Região (TRF2) e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), teve lugar na sede da FGV do Rio de Janeiro.

Em sua fala, o ministro alertou para o impacto potencial das decisões judiciais sobre a economia e o mercado e conclamou os juízes a reconhecer essa responsabilidade nos julgados: “O Judiciário precisa estar atento. Uma decisão que não considere todas as dimensões envolvidas pode, simplesmente, destruir um segmento econômico e encarecer produtos, em nome de uma proteção ao devedor, muitas vezes indevida. É preciso lembrar que a função de proteger é da lei e ao juiz cabe limitar-se a cumpri-la. A confusão dos papéis de julgador e legislador só prejudica o cidadão”, advertiu.

João Otávio Noronha ressalvou, contudo, que o Estado tem uma atuação importante nas relações de consumo. Ele citou a crise econômica iniciada nos Estados Unidos em 2007 como um exemplo dos danos que podem ser causados pela negligência do governo, que falhou na regulamentação e fiscalização do mercado imobiliário, gerando um colapso no sistema de crédito aos compradores.

 

Sergio Guerra, Marcus Abraham, João Otávio de Noronha e Antonio José Maristrello Porto

 

O presidente do STJ também falou sobre crimes econômicos e corrupção e abordou pontos do novo projeto “anticrime” do governo federal, destacando a possibilidade de celebração de acordos com os investigados, que hoje são vetados. João Otávio Noronha ressaltou a necessidade de o Judiciário, pensando nos interesses da sociedade, agir para “punir os empresários e não as empresas” e encerrou defendendo que o trabalho dos magistrados deve estar livre de preconceitos: “O juiz só pode ter uma ideologia: a da Constituição Federal, que prega o direito à livre iniciativa. Só com isso em mente ele pode contribuir para manter hígida e íntegra a ordem jurídica nacional”.

Acordo de cooperação científica

O seminário “Direito e Economia: Finanças Públicas e Concorrência no Sistema Financeiro Nacional” é o mais recente desdobramento do acordo de cooperação científica firmado em maio de 2018 entre a FGV e o TRF2, por intermédio da Escola da Magistratura Regional Federal (Emarf). O objetivo da parceria é promover a troca de conhecimentos e práticas que contribuam para o aperfeiçoamento tanto da atividade dos juízes quanto do conhecimento acadêmico.

O seminário foi organizado pelo diretor de intercâmbio e difusão da Emarf, desembargador federal Marcus Abraham e pelos professores da FGV Antonio José Maristrello Porto, Armando Castelar Pinheiro e Patrícia Regina Pinheiro Sampaio. A mesa diretora foi composta pelo diretor-geral da Emarf, desembargador federal Luiz Paulo da Silva Araújo Filho, pelo diretor da Escola de Direito da FGV-Rio, professor Sergio Guerra, pela diretora da Rede de Pesquisa e Conhecimento Aplicado, professora Goret Pereira Paulo e por Marcus Abraham, que proferiu palestra sobre o uso da inteligência artificial no Judiciário, em especial nas ações envolvendo a Fazenda Pública.

 

Goret Pereira Paulo, Marcus Abraham, Sergio Guerra e Luiz Paulo da Silva Araújo Filho

 

Inteligência artificial

Na sua exposição detalhada, o desembargador Marcus Abraham citou experiências do tipo já existentes e em desenvolvimento, no Brasil e no mundo. Ele explicou que os sistemas de inteligência artificial se baseiam em algoritmos, “que nada mais são do que sequências de procedimentos, uma espécie de passo a passo definido para a execução de tarefas específicas”.

Marcus Abraham esclareceu que as ferramentas de inteligência artificial se caracterizam pela capacidade de evoluir, aprendendo com a experiência nas tarefas executadas. Ele citou as possibilidades de utilização de robôs na advocacia, na mediação e conciliação de litígios, nas auditorias fiscais e até no julgamento de causas, ajudando a acelerar a tramitação e a solução das ações: “Os sistemas de computação cognitiva podem ter variadas aplicações, como, dentre muitas outras, a leitura de peças processuais em grande velocidade, a pesquisa de jurisprudência e legislação e mesmo a sugestão de soluções para as lides, a partir da análise das tendências mais atualizadas na jurisdição”, disse.

Parâmetros éticos e legais

Especificamente nas disputas relacionadas à Fazenda Pública, Marcus Abraham afirmou que a utilidade da inteligência artificial está no auxílio a medidas para a constrição de bens de devedores, que hoje são difíceis e lentas. Para isso, ela pode cruzar dados nas redes sociais e em sites de compras e contratação de serviços, rastreando ações que possam revelar a existência de recursos para reparação de dívidas tributárias.

“O grande desafio do momento é garantir que os algoritmos sejam alimentados com parâmetros éticos e legais, de modo que, efetivamente, no exercício de tomada de decisões, sirvam de apoio à efetivação do ideal de justiça”, acrescentou Marcus Abraham. Para ele, os sistemas de inteligência judicial desenvolvidos para o Judiciário precisam atender aos critérios de impessoalidade e transparência e, também, devem poder ser auditáveis: “Não se pode admitir qualquer eventual opacidade no sistema, que possa significar risco ao devido processo legal e desrespeito aos princípios da boa-fé, da confiança legítima e da segurança jurídica”, alertou.

O painel em que Marcus Abraham palestrou foi presidido pelo desembargador federal Sergio Schwaitzer. Nele também fizeram explanações o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas, que discorreu sobre tecnologia e o combate ao desvio de recursos públicos, e a economista Ana Carla Abrão, da empresa de consultoria financeira Oliver Wyman, que falou sobre reforma de recursos humanos do Estado.

 

Sergio Schwaitzer, Bruno Dantas, Marcus Abraham e Ana Carla Abrão

 

Também compôs a programação do evento o painel “Regulação e concorrência no Sistema Financeiro Nacional: uma nova agenda”, conduzido pelo desembargador federal Alcides Martins Ribeiro Filho. Os palestrantes foram o diretor de Política Econômica do Banco Central, Carlos Viana de Carvalho, e o professor Sergio Werlang, da Escola Brasileira de Economia e Finanças da FGV.

 

A partir da esquerda: Carlos Viana de Carvalho, Alcides Martins e Sergio Werlang
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