Julgado recurso de ex-diretores do Bacen condenados por operação de socorro a bancos

Publicado em 29/11/2010

          Quando é cometido crime contra o patrimônio público, “a dívida com a sociedade deve ser cobrada até o último centavo”. Assim, o Estado deve cobrar dos responsáveis “tanto na esfera penal como na civil, sem, no entanto, impor sanção desproporcional e inútil, o que significaria retrocesso do entendimento sobre a função da pena, ao tempo em que se lhe atribuía o papel de vingança”. O entendimento consta do voto do desembargador federal Messod Azulay proferido no julgamento de embargos infringentes, nos quais a Primeira Seção Especializada do TRF2 decidiu reduzir a pena de três ex-diretores do Banco Central (Bacen) condenados por peculato.
          O caso refere-se à operação de socorro aos Bancos Marka e FonteCindam realizada no final da década de 1990. Em primeira instância, os réus foram condenados e apelaram ao TRF2. A Primeira Turma Especializada da Corte manteve a condenação, que ficou em seis anos de reclusão. Por conta disso, os ex-diretores apresentaram os embargos infringentes.
           Em janeiro de 1999, o Bacen elevou o teto da cotação do dólar, para conter os reflexos no Brasil da crise financeira mundial iniciada no ano anterior. Os bancos envolvidos tinham valores maiores que o seu próprio patrimônio líquido aplicados em contratos em dólar. Como ficaram sem ter como honrar seus compromissos, pediram auxílio ao Bacen, que, para evitar maiores danos ao mercado, vendeu dólares a uma cotação mais baixa especificamente ao Marka e ao FonteCindam. Só que a operação causou um prejuízo aos cofres públicos estimado em R$ 1,5 bilhão.
           Entre outros argumentos, os acusados sustentaram a existência de documentos dos procuradores do Bacen atestando a legalidade da operação de ajuda aos bancos. Em primeira instância, a pena base havia sido agravada pelo juiz em razão da “culpabilidade intensa” e das “circunstâncias e consequências do crime”. No entendimento do desembargador federal Messod Azulay, que teve seu voto acompanhado à unanimidade pela Primeira Seção Especializada, houve excesso de rigor na interpretação dos fatos e das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal. O artigo cuida da fixação da pena, que deve levar em consideração, entre outros aspectos, a culpabilidade, os antecedentes e a conduta social do réu.
           O magistrado destacou a culpabilidade dos ex-diretores do órgão, mas chamou atenção para a ocorrência, em dois momentos da sentença, do chamado “bis in idem”. Ou seja, eles tiveram as penas elevadas mais de uma vez pelos mesmos fundamentos. A primeira repetição aconteceu quando foram analisadas a motivação do crime e a intensa culpabilidade como critérios de aumento da pena. Para o desembargador, foram utilizados os mesmos elementos para os dois itens.
          A segunda, ocorreu na apreciação da “forma intensa e ‘amoral’ como intervieram os ex-diretores do Bacen no mercado”. Messod Azulay lembrou que a violação, em si, das regras de intervenção no mercado constituiu o crime, não podendo ser novamente considerada como circunstância desfavorável para aumento da pena.
         O relator do caso encerrou seu voto esclarecendo que “ao se utilizar, primordialmente, da via carcerária como a adequada para proteger a estrutura social, o nosso sistema penal tende a acirrar a potencialidade delitiva, ao invés de contribuir para diminuição do número de delitos. Por esta razão, como forma de tentar minimizar os efeitos de um sistema penal vingativo e que apresenta níveis de falibilidade exacerbados, há que se limitar sua intervenção punitiva aos limites recomendados pela proporcionalidade”. Nos termos da decisão da Primeira Seção Especializada do TRF2, os três réus tiveram as penas de reclusão reduzidas para quatro anos.

Proc. 1999.51.01.046981-8

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