Encontro dos juízes de enlace latinos e caribenhos discute acompanhamento da criança após o retorno ao país de origem

Publicado em 17/05/2024

Na sequência do evento, a programação da quinta-feira (16) teve início com a apresentação de painéis sobre temas sensíveis envolvendo o cumprimento do acordo firmado em 1980 na Cidade da Haia, nos Países Baixos, que trata dos casos de subtração internacional de crianças. O Fórum teve início na quarta-feira (15) e será concluído nesta sexta (17).

Em uma das mesas realizadas na parte da manhã, o ministro André Veras, do Ministério das Relações Exteriores (MRE), e o coordenador da Rede Brasileira de juízes de enlace, desembargador federal Guilherme Calmon, exploraram o tema “Salvaguardas quanto ao retorno da criança, migração da criança e dos pais e acompanhamento pós-retorno”.

Sob a presidência do desembargador federal Theophilo Miguel, o painel foi aberto com a fala do diretor do Departamento de Imigração e Cooperação Jurídica do MRE. Ele iniciou lembrando que o tema envolve a atuação da diplomacia, cujas funções incluem defender e dar assistência a brasileiros no exterior. “O Itamaraty é uma caixa de ressonância de nossa sociedade, além de cumprir normas regulatórias da atuação estatal no plano internacional”, afirmou André Veras.

A questão central discutida no encontro chama a atenção do ministro há, pelo menos, dez anos, segundo relatou. Nesse tempo, disse, vem refletindo sobre o papel dos juízes de enlace para garantir os direitos da criança: “Os juízes de ligação têm a responsabilidade de suprir falhas e preencher as lacunas da Convenção que, apesar de tê-las, é o melhor instrumento para solução de casos de subtração”. Veras elogiou a atuação dos magistrados. “Pelo trabalho dos juízes, pode-se chegar sempre a uma conciliação.” afirmou.

O ministro contou que o MRE tem um protocolo de atendimento para cidadãs e, eventualmente, cidadãos vítimas de violência doméstica. “Como vivem no exterior, muitas brasileiras têm dificuldades de registrar agressões na polícia, sobretudo quando uma criança está envolvida. Muitas são vítimas de xenofobia quando prestam queixas na polícia. Registramos porque pode ser usado como prova mais tarde”, revelou.

Defesa da cooperação e da atuação pela atualização normativa

Em sua palestra, o desembargador federal Guilherme Calmon salientou que a cooperação é essencial para o enfrentamento desse drama. “A diplomacia é importante. O sistema da Justiça não pode ser pensado de uma forma isolada”, pontuou.

Calmon lembrou que o uso de uma criança “como instrumento de vingança sempre existiu”, mas alertou que, na era da superconectividade, essa prática se manifesta também pelas redes sociais, ampliando seus efeitos prejudiciais. Ele destacou a necessidade, portanto, da constante atualização do debate, considerando as rápidas transformações na sociedade.

O magistrado conclamou à discussão sobre protocolos e sistemas de monitoramento das condições da criança após o retorno, que considera fundamental: “Como a criança estará? Como ficará sua situação? O seguimento do caso não se deve dar apenas em questões jurídicas, como cumprimento da guarda, das visitas, de alimentos. Devemos também saber se o interesse da criança foi ou não atendido em todo o processo”, declarou.

Calmon disse que o papel dos juízes no plano normativo também exige uma reflexão, defendendo uma posição prospectiva por parte das autoridades atuantes no sistema de justiça. Como exemplo, ele citou a resolução nº 449, de 2022, do CNJ, “que inova em muitos momentos no ordenamento jurídico, preenchendo lacunas em favor da maior efetividade no cumprimento da Convenção de 1980. Se observamos o disposto no artigo 26, que trata da designação, da competência, das atribuições e dos propósitos da rede de juízes de enlace, veremos que essa figura sequer encontra previsão na legislação brasileira e que mesmo no texto da Convenção de 1980 não está presente”.

Na conclusão do painel, o debatedor, desembargador federal Rogério Fialho, juiz de enlace e ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), sintetizou as falas dos palestrantes como um alerta para os traumas sofridos pela criança no centro de disputas parentais. “Há que se ter muito cuidado com elas. Em ações desse tipo, o uso da força policial, por exemplo, pode trazer traumas. Por isso, é necessário que as ações não sejam ostentivas”, alertou. E acrescentou: “Faço coro à ideia, que tem sido ventilada neste fórum, de criar-se um plano de retorno da criança, que considere as  suas necessidades em diversos aspectos, incluindo o direito à educação, à saúde, ao apoio psicológico e à reintegração social”, declarou.

 

Textos: AC e PMS (TRF2) / Fotos: TRF2

Compartilhar: