Desembargador do TRF2 fala sobre novo CPC na Escola da Magistratura de Rondônia*

Publicado em 18/11/2015

Nos dias 12 e 13 de novembro a Escola da Magistratura do Estado de Rondônia (Emeron) recebeu o desembargador federal do TRF2 e membro do Conselho Superior da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, para ministração do 4º módulo do Ciclo de Formação promovido pela Emeron acerca do Novo Código de Processo Civil (NCPC), intitulado “Precedentes e Jurisprudência: Julgamentos Repetitivos no Novo Código de Processo Civil”.

Para o diretor em exercício da Emeron, juiz Ilisir Bueno Rodrigues, o processo formativo realizado pela Escola tem um ganho significativo com a presença do desembargador Aluísio Mendes, por seu vasto currículo acadêmico e sua experiência como membro da Comissão de Juristas designados para o acompanhamento da redação final do novo Código de Processo Civil no Senado e coordenador do Grupo de Trabalho da Enfam para desenvolvimento do programa de atualização da magistratura nacional acerca do tema.

Durante toda a quinta-feira, 12, o desembargador palestrou sobre os vinte itens mais importantes de todo o novo código de processo civil, focando nos precedentes, na jurisprudência e nos julgamentos de casos repetitivos. Na manhã da sexta-feira, 13, foram realizadas quatro oficinas com os temas abordados no módulo, acompanhadas pelo desembargador. Durante as oficinas foram elaborados enunciados, aprovados em plenária na tarde da sexta-feira. Ainda na tarde de sexta, foram socializadas a experiência das oficinas e houve ministração do desembargador Aluísio Mendes sobre recursos repetitivos. Em torno de 200 magistrados e assessores participaram da formação.

“Em primeiro lugar é um prazer, uma honra estar aqui em Porto Velho e fiquei satisfeito em ver a estrutura física e humana que a Emeron conta para realizar o empreendimento da educação judicial. A Escola é um ambiente natural de interação com a sociedade, de desenvolvimento de uma magistratura altamente qualificada. Visitando as oficinas vi uma grande discussão, todos interessados e isso é algo importantíssimo para sociedade”, afirmou o desembargador.

Aluísio Mendes concedeu ainda uma entrevista à Assessoria de Comunicação da Emeron em que falou sobre sua vinda ao estado e as principais mudanças do código processual civil brasileiro. Confira abaixo a entrevista na íntegra.

Conselheiro da Enfam fala sobre atuação das Escolas de Magistratura e mudanças no novo CPC

Na manhã da última sexta-feira, 13, na ocasião de sua vinda à Porto Velho para ministrar o 4º módulo do Ciclo de Formação promovido pela Emeron acerca do Novo Código de Processo Civil (NCPC), intitulado “Precedentes e Jurisprudência: Julgamentos Repetitivos no Novo Código de Processo Civil”, o Desembargador Federal e membro do Conselho Superior da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, concedeu entrevista à Emeron em que falou sobre os pontos relevantes do novo código e da atuação das Escolas de Magistratura no país. Confira abaixo a entrevista na íntegra.

1) O Senhor tem um trabalho como membro do Conselho Superior da Enfam e do grupo de trabalho que desenvolve as formações sobre o novo Código de Processo Civil (NCPC) e também junto à Câmara dos Deputados para a redação final do novo código. Sua vinda à Emeron é extremamente engrandecedora em razão de sua experiência, além de seu currículo acadêmico, que confere, a quem lhe ouve a experiência de alguém que ajudou a realizar a nova Lei. Como o Senhor enxerga sua vinda até aqui para ministrar essa formação?

Em primeiro lugar é um prazer, uma honra, uma satisfação estar em Rondônia, em Porto Velho. A minha vinda aqui acabou sendo um evento conjunto da Enfam com a Emeron, dentro de uma missão que é da Enfam, a de traçar diretrizes e realizar em conjunto com as escolas determinados eventos. Em termos de traçar diretriz, o Ministro João Otávio Noronha foi muito feliz em criar um grupo de trabalho para empreender um programa de atualização nacional em relação ao novo CPC. Eu fiquei muito honrado com a designação da Coordenação desse grupo e me orgulha muito principalmente o evento que nós fizemos em agosto, que foi o seminário nacional sobre o novo CPC com a participação de cerca de 500 magistrados federais e estaduais e a aprovação de importantes enunciados.

Em segundo lugar, o trabalho da Enfam não se esgota em um evento nacional. Portanto, é importante a iniciativa da Escola de Rondônia que está dando continuidade a esse trabalho de atualização. Eu vi nas oficinas e, ontem, ao longo de todo dia, como há questões polêmicas, que suscitam dúvidas em torno da aplicação do novo CPC. E aí é fundamental que a magistratura se prepare, porque nós vamos aplicá-lo. Até agora nós estamos debatendo, discutindo, conversando. A partir de 18 de março de 2016 nós vamos ter que decidir e aí é bom que possamos decidir com segurança. E essa segurança só pode existir se os magistrados tiverem lido, estudado, debatido, conversado, trocado experiências sobre esse assunto. O próprio código teve uma vacatio legis (vacância da lei) de um ano. Durante os primeiros meses, muita gente se manifestou contra ou a favor, mas a partir de um determinado momento o nosso grupo de trabalho orientou no sentido de não apenas discutir se é favor ou contra ou bom ou é ruim, mas de aprofundar esse estudo de como vamos aplicar a partir da análise de todas as partes do código de processo civil. E é isso que está sendo feito.

Sobre o evento de que estou participando em Rondônia, gostaria de dizer que estou muito satisfeito, pois nós tivemos um dia inteiro em que eu pude fazer uma exposição em três partes. A primeira foi um apanhado geral em que procurei destacar vinte itens mais importantes de todo o Código de Processo Civil, para que pudéssemos falar um pouco sobre cada um desses assuntos.

Depois falamos uma parte inteira sobre precedentes e jurisprudência, que são uma grande inovação do novo Código de Processo Civil. E por fim, os chamados julgamentos de casos repetitivos, principalmente o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR). E esses dois temas são, talvez, a maior aposta do novo CPC. Fiquei muito honrado e feliz em vir a Rondônia falar sobre, talvez, um dos temas mais importantes do NCPC. E complementamos com o trabalho do dia de hoje. Agora pela manhã, visitei as oficinas e vi como está sendo profícuo o trabalho. Em todas as oficinas que eu passei, há uma grande discussão, todos interessados, um debate vivo, acirrado. E agora a tarde vamos socializar a experiência das oficinas e eu ainda vou falar um pouco mais sobre os recursos repetitivos. É uma iniciativa muito salutar.

Uma das coisas que eu acho que vai resultar em um desdobramento muito importante é o fortalecimento da isonomia. O que a gente não quer é que o poder judiciário gere insegurança, então é natural que uma pessoa venha ao judiciário e tenha eventualmente uma decisão diferente da outra num primeiro momento. Mas isso não pode se perpetuar. O judiciário, o mais rápido possível, tem que uniformizar o seu entendimento. Esses dois mecanismos, o do precedente e o da jurisprudência, junto com o julgamento repetitivo, permitirão isso. Uma iniciativa importante é que os magistrados do 1º grau levem ao Tribunal, o mais rápido possível, quais são os temas que precisam de uma uniformização. Eu estou colhendo aqui em Rondônia uma prática muito interessante: antes da entrada em vigor o novo CPC, e até independentemente do IRDR, os magistrados de 1º grau começaram a selecionar os temas mais polêmicos para sugerir ao tribunal que os discuta logo em seguida, através de IRDR ou do Incidente de Assunção de Competência ou dos mecanismos de uniformização de jurisprudência. Essa é uma experiência incrível que deve ser retransmitida para todos os outros tribunais de justiça e até para os tribunais federais como uma boa prática aqui de Rondônia que deve ser estimulada em todo o Brasil.

No CPC, esses instrumentos a que eu me referi visam a alguns objetivos. Eu destacaria a economia processual, que pode não vir imediatamente, mas sim a médio e longo prazo. A partir do momento em que se criam mecanismos de uniformização da jurisprudência e do entendimento, facilita-se o julgamento dos casos repetitivos e, principalmente, o judiciário oferece à sociedade a sua interpretação unificada. Com a uniformização há uma segurança jurídica e uma certeza maior. Além de diminuir o ajuizamento de ações desnecessárias, já que o cidadão passa a saber previamente o entendimento fixado pelo STJ. O contrário também acontecerá, o indivíduo, vendo as jurisprudências, passa a ter certeza de que ajuizando a ação ela será procedente. Nesses casos que já têm uma definição, a tendência é a sociedade se amoldar.

Algumas pessoas falam que a lei deve ser cumprida e não o precedente. Não. A interpretação da lei quem dá é o Poder Judiciário. Se o Poder Judiciário disse claramente que a interpretação é X, aquilo é a interpretação da lei. E a lei deve ser cumprida na forma estabelecida pelo Judiciário.

2) Como o senhor entende o debate da justiça com a sociedade vindo a partir da experiência dos magistrados e colocada no âmbito acadêmico a começar pelas Escolas de Magistratura? Como isso é relevante e como a sociedade influencia nesse debate do novo Código?

Isso é fundamental. Eu tenho quase 22 anos de magistratura e até há algum tempo atrás a preparação para ser magistrado era quase nenhuma e ao longo do tempo não havia muita atualização. Essa realidade vem sendo modificada com a criação das escolas e seu fortalecimento em cada tribunal e a partir, singularmente, da Emenda 45, com a criação da Enfam. Isso é essencial pois o magistrado que ingressou na magistratura precisa de toda uma preparação específica para conhecer a parte de sistemas e a parte prática que são muito importantes. E o magistrado que está a mais tempo também tem que se atualizar, a exemplo do novo CPC em que todos precisam estudar a questão.

As escolas precisam se fortalecer. Outra coisa que fico muito satisfeito em ver é que a Escola de Rondônia se encontra num prédio novo com uma equipe estruturada de servidores, pois encontramos também escolas mais frágeis, sem contar com a estrutura necessária para o empreendimento dessa atividade. A estrutura é fundamental para que as escolas funcionem bem, pois elas não podem ser um imprevisto, elas vieram para ficar. A ministra Carmem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, uma vez contava o caso do lenhador que precisa sempre parar seu trabalho para afiar seu instrumento de modo que ele possa continuar trabalhando com eficiência. O magistrado é a mesma coisa. Não adianta achar que o magistrado não pode parar de trabalhar para estudar em razão dos muitos processos. Se assim for ele vai deixar de afiar seus instrumentos, vai perder conhecimento, vai perder a oportunidade de ter contato com outras experiências.

Eu vim a Rondônia e estou levando uma boa experiência daqui pra Enfam. Do mesmo modo, procurei compartilhar algumas ideias e práticas que eu tenho, tanto da academia quanto da magistratura. Por isso é importante trazer nas palestras e em todas as iniciativas pessoas que conhecem os assuntos para fazer com que a magistratura seja altamente qualificada, pois aí ela irá prestar melhor a jurisdição e a Escola é um ambiente natural de interação com a sociedade. Eu estou aqui na condição de magistrado, mas também na condição de professor, de autor de livros. Do mesmo modo, as escolas sempre promovem a vinda de professores, autores e pessoas de outras áreas, como medicina e engenharia, para que o magistrado conheça melhor as questões sobre as quais ele precisa decidir. O foro da Escola é o espaço para isso. Eu espero que seja usado da melhor forma para que os juízes possam devolver à sociedade essa boa prestação jurisdicional.

3) Um dos pontos do novo CPC é a conciliação antes da judicialização da demanda. Com o novo CPC a sociedade ganha não só com a diminuição da judicialização e o tempo do processo, mas também é uma forma do judiciário trabalhar uma cultura de paz na sociedade a partir dessa nova política de conciliar os conflitos antes de judicializar?

Esse foi o primeiro ponto que abordei na minha exposição. Falei que o NCPC traz, de forma inovadora, o fortalecimento dos meios chamados alternativos – eu costumo dizer, meios adequados – à solução dos conflitos, principalmente a partir da solução consensual. O código o faz em três dispositivos distintos. A primeira é muito significativa, pois inclui no parágrafo 3º, do artigo 2º, o dever de todos os profissionais do direito (magistrados, advogados, Ministério Público, Defensoria Pública) de buscar os meios consensuais. E isso é estabelecido como norma fundamental.

A partir do art. 165, o código cria a figura dos conciliadores e mediadores, como auxiliares da justiça. É claro que essas funções já existiam, especialmente na resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, mas não havia a figura do auxiliar do juízo voltado para a conciliação e a mediação. O código traz para si tudo isso que foi criado e fortalecido no âmbito do CNJ, estabelecendo primeiro uma justiça multiportas. O código fala especialmente em mediação e conciliação, mas a ideia é abrir os meios adequados. Eventualmente, pode ser a arbitragem por ser um assunto especializado e supõe-se que haja Tribunais ou juízes arbitrais especializados naquele assunto. Por outro lado, o conflito pode envolver relações estáveis como famílias e vizinhos. O mais importante é criar as condições para que essas relações melhorem. Para isso, há que se ter uma formação especializada. Assim como o árbitro é especializado, o mediador tem que estar preparado. Como essa preparação é mais específica tanto para mediação quanto para a conciliação, o código procura estabelecer a necessidade do auxílio desses profissionais. O código atual já previa no art. 125, inciso IV, esse dever para o juiz, mas às vezes o juiz está preocupado com as questões jurídicas e há técnicas que um auxiliar pode dominar melhor. Isso não retira a função do magistrado de também se aprimorar nesse sentido e de a todo momento do processo buscar a conciliação. Essa chance inicial é importante, pois as partes estão no início do conflito e talvez seja mais fácil, neste momento, chegar-se a um acordo do que depois que já se gastaram recursos com provas e advogados.

O terceiro item dos meios consensuais está na previsão do art. 334 da audiência de conciliação como o primeiro ato do processo, após sua instauração. Em vez de o juiz, em regra, mandar citar as partes para apresentarem suas defesas e partir para a audiência preliminar, ele determina primeiro uma audiência de conciliação e mediação e depois, se não houver acordo, inicia-se o prazo para o oferecimento da contestação e se poder seguir com o processo. Há algumas orientações a serem destacadas. Não se quer o acordo a todo custo, isso é até perigoso. Há um princípio que é estabelecido pelo código de que devem ser preservados os direitos mínimos das partes. Não se quer fazer um acordo em detrimento do próprio direito ou impor um acordo. A ideia é que a solução seja encontrada pelas partes e não haja nada impositivo. Há que se respeitar isso ou, do contrário, teremos uma solução ruim. Uma das coisas boas da solução consensual é que as partes saem satisfeitas e entendendo que aquilo foi o melhor para sua vida. Se ela sai pensando o contrário acaba sendo incoerente.

*Com informações da Assessoria de Comunicação – Emeron

Compartilhar: