Seminário 25 Anos da Constituição Cidadã: Para desembargador Guilherme Calmon, correlação entre a Constituição e Direito Privado tem de ser construída com cuidado*

Publicado em 09/09/2013

        “Estamos em um trabalho de construção das correlações entre a Constituição e o Direito Privado e acredito que ainda possamos corrigir vários rumos que estão sendo desviados”, concluiu o desembargador federal do TRF2 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em sua palestra “Constituição e Direito Privado: uma relação em construção” no seminário 25 Anos da Constituição Cidadã, no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O evento foi uma promoção do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF). O ministro do STJ, Ricardo Villas-Boas Cueva presidiu a mesa.
        No entendimento do desembargador federal, é preciso estabelecer com cuidado onde e quando poderá haver a incidência das normas de direito fundamental no Direito Privado. “Precisamos ter muito cuidado na busca da concretização dessas normas, de modo a não permitir que haja uma autêntica loteria em relação às escolhas que podem ser feitas em relação às situações concretas”, afirma.
        Ele assinala que a questão das técnicas de reprodução humana assistida, por exemplo, ainda não mereceu tratamento legislativo adequado e as regras de Direito Civil existentes sobre o tema são insuficientes. “Por outro lado, há uma atuação intensa do Conselho Federal de Medicina normatizando como os médicos deve se portar nessa seara”, aponta. Com relação à técnica de reprodução assistida, Guilherme Calmon menciona a hipótese de uma viúva que teve seu marido falecido com o seu esperma congelado e, após  a morte dele, pretende iniciar uma gravidez. “Até que ponto esta é uma técnica admissível?”, questiona.
        Outro exemplo citado por ele é a da chamada “doação cruzada de gametas”: uma mulher que tem dificuldade para engravidar mas tem óvulos férteis se dispõe a doar óvulos para outra mulher, que não pode engravidar por não ter óvulos férteis. Em troca, esta última se dispõe a custear o tratamento da primeira. De acordo com Guilherme Calmon, essas são hipóteses previstas pelo CFM como legítimas. “Será que o nosso ordenamento jurídico admite essas regras?”, indaga novamente. Para ele, há uma omissão do legislador em relação a essas questões. “É proibida por lei a comercialização de partes do corpo humano e, no segundo caso, está havendo, sim, vantagem patrimonial”, observa o desembargador federal.
        Outra questão delicada nas relações entre particulares, tangenciadas pelas normas de direitos fundamentais, foi o julgamento, por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), de uma ação direta de inconstitucionalidade a respeito de união entre pessoas do mesmo sexo. “Na falta de positivação do nosso ordenamento jurídico a respeito dessas uniões, o STF acabou por estabelecer que não se pode excluir a união entre pessoas do mesmo sexo, um autêntico ativismo jurídico, na minha opinião”, afirma Guilherme Calmon.
        Saber qual é o grau de influência das normas de direitos fundamentais nas relações entre particulares, e como devem atuar essas normas, para o desembargador federal, é uma das grandes questões do Direito Privado. “Surgiu a teoria da eficácia imediata ou direta dessas normas no que tange aos particulares.  Criticando essa teoria, veio a teoria da eficácia indireta das normas de direitos fundamentais para particulares. Precisariam sofrer a intermediação do legislador, que tem de dar concretude a essas normas, senão haveria esvaziamento da autonomia privada”, explica ele.
 
*Fonte: CJF
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