TRF2 leva juízes para conversar com adolescentes da Cidade de Deus

Publicado em 19/07/2013

        Dois caçadores caminhando na mata, vindo de direções diferentes, avistam em uma clareira um grande animal. Eles atiram suas flechas quase simultaneamente, pensando que terão carne e pele para alimentar e vestir suas famílias. O animal tomba morto e os dois homens alcançam o corpo quase ao mesmo tempo. Aí, a  dúvida. Quem viu primeiro o bicho? Quem o matou? Na pré-história, quando os primeiros grupos humanos ainda não contavam com uma organização social bem definida, a solução dos conflitos se dava pela violência: quem fosse mais forte,  levaria a carcaça. Só mais tarde, com as primeiras formas de civilização, as pessoas passaram a entregar a tarefa de decidir as disputas nas mãos de um árbitro: o homem mais velho e mais sábio, o pajé da tribo, o líder do clã.
       Essa alegoria foi o “gancho” com que o juiz federal Paulo Alberto Jorge capturou a atenção dos cerca de 40 jovens integrantes do programa Protejo, que atende adolescentes da Cidade de Deus e de outras comunidades da Zona Oeste carioca em situação de vulnerabilidade social. Na quinta-feira, 11 de julho, a Coordenadoria dos Juizados Especiais da Segunda Região, que compõe a estrutura do TRF2, realizou na sede do programa, no bairro de Jacarepaguá, mais uma edição do projeto “A Justiça Federal vai ao Cidadão”. O evento começou com a conversa com o magistrado, seguida da simulação de uma audiência de julgamento, na qual os rapazes e moças, entre 15 e 24 anos, representaram os papéis de autor da ação, testemunhas, defesa, réu e advogado do acusado. Por fim, a Justiça Federal ofereceu um lanche aos alunos e professores do Protejo, que é fruto de parceria do Ministério da Justiça com a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Suas principais atividades são os cursos de diversas áreas, como os de DJ, informática e dança. As aulas acontecem diariamente, das 8 às 17 horas, e os alunos com frequência regular recebem uma bolsa mensal.

Solução de conflitos

        A história da discórdia entre os caçadores serviu para despertar a curiosidade da plateia sobre por que e como o Judiciário se estruturou ao longo da história, institucionalizando a figura do juiz como o representante público investido do poder de decidir e de fazer cumprir suas decisões, de acordo com as leis, para garantir a paz, a segurança e os direitos de todos, fortes ou fracos: “O conflito sempre existiu, e, se a gente pensar bem, vai lembrar de algum que viveu hoje mesmo. Pode ter sido algum desentendimento com um irmão, com os pais, com um amigo…pode  ter sido um desconforto no ônibus, um troco errado. E se hoje, havendo ordem, normas fortes e autoridades para fazer valer a razão e o direito, ainda vemos tanta coisa errada acontecendo, imaginem como era no tempo das cavernas”, alertou Paulo Alberto Jorge.
        O interesse do público na exposição foi evidenciado pelas muitas perguntas dirigidas ao juiz, impressionantes pela maturidade. Uma das jovens, por exemplo, quis saber por que os juízes teriam privilégios que não são assegurados a outros trabalhadores. Na linguagem simples e didática que marcou toda sua explanação, Paulo Alberto Jorge explicou que a Constituição garante a vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos dos magistrados para assegurar sua independência: “Às vezes, temos de julgar pessoas ricas, poderosas. Por isso a lei prevê direitos para impedir algum tipo de pressão política ou econômica sobre as nossas decisões”.
        O palestrante, que contou, em sua exposição, com o apoio do juiz federal Vladimir Vitovsky, ainda falou sobre sua trajetória na magistratura, revelando que se submetera a outros concursos da carreira sem sucesso, antes de ser aprovado para o cargo na Justiça Federal do Rio de Janeiro: “Passei dois anos mergulhado nos livros e não permiti que nada me desviasse do foco. Até nas festas em família, no Natal, nos aniversários, logo depois de cear ou de cantar parabéns, eu me recolhia para voltar ao estudo”, disse, e concluiu: “Se eu consegui, qualquer um de vocês consegue. Com dedicação e coragem, qualquer meta pode ser alcançada.”
        As explicações do hoje componente da Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais fluminenses incluíram, também, entre vários outros pontos, a organização e os ramos do Poder Judiciário (Justiça do Trabalho, Eleitoral, Militar, e Comum – Federal e Estadual), o sistema processual brasileiro, a estrutura e funcionamento dos Juizados e das Varas, os requisitos para o ajuizamento de ações e a atuação de todos os chamados operadores do Direito, ou seja, magistrados, advogados, procuradores e promotores: “Quando eu era criança, sonhava em ser médico. Eu me via como um herói, que salvaria muita gente. Os caminhos da vida me levaram para o Direito. Acho que, de certa forma, o juiz também tem a missão de salvar, livrando as pessoas de um outro tipo de mal, que não é a doença, mas também causa muito sofrimento, a injustiça”, afirmou Paulo Alberto Jorge.

A simulação de audiência tratou de um caso de dano moral. Paulo Alberto Jorge vestiu a toga para fazer o “papel” de juiz
A simulação de audiência tratou de um caso de dano moral. Paulo Alberto Jorge vestiu a toga para fazer o “papel” de juiz
a plateia
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